24 de fevereiro de 2011

Reacções adversas

É em alturas destas, em dias de vacinas, que me recrimino silenciosamente por ser tão emocional. A emoção deturpa a razão e ata-nos as mãos. Ficamos sem outra reacção que não seja a lágrima que luta para sair e o nariz a pingar como se já tivéssemos chorado muito.
"O pai que a segure, porque a mãe está em choque", dizia a enfermeira. O pai, claro, lá puxou a razão do bolso, onde a guarda sempre em quantidade suficiente, e segurou nas perninas com a força que eu não tinha, porque só me apetecia agarrar na minha menina e sair dali para fora. Seus maus, são uns maus. Mas lá aguentei a estopada de três vacinas. Só se safou o braço esquerdo, porque a quarta era bebível... Excesso de zelo dos pais, talvez. Tanta vacina para quê, se até a enfermeira achou uma maldade. Lembro-me de, durante a gravidez, ter lido alguns livros de parentalidade natural cujos autores questionavam a necessidade de vacinar as crianças. Confesso que passei essa parte com a arrogância de quem acha que não há necessidade de fingirmos que vivemos no terceiro mundo. A minha parentalidade natural fica-se por procurar uma pediatra que não seja apologista de dar medicamentos ao primeiro sintoma e por recorrer primeiro ao alternativo e natural antes de me render ao prático e usual.... Se está ao nosso alcance evitar que os nossos filhos adoeçam e se até podemos comprar as vacinas que não são comparticipadas, por que não havemos de o fazer? Mesmo que nos deixemos vencer pela desolação de os ver sofrer, a recompensa pela dor de ontem, deles e nossa, será muito maior amanhã.
E hoje, depois de uma noite de muito choro*, ela voltou a sorrir e está sol e estamos as duas deitadas na cama a congeminar para onde vamos passear.

* e podia ter sido bem pior...

14 de fevereiro de 2011

Das parecenças

Nisto das parecenças é inevitável, cada um puxa a brasa à sua sardinha. A família paterna diz que ela é a cara chapada do pai, a família materna diz que não, não, ela sai é à mãe. Depois ainda há os amigos e os pais dos amigos e até a mulher-a-dias que, ou porque se sentem no dever de dizer alguma coisa ou porque querem agradar à respectiva parte, afiançam que sai ora a um ora a outro.
O que vale é que toda a gente gosta de mandar o seu bitaite. E a gente nem leva a mal. Até acha graça, na verdade, porque entre tantas opiniões há sempre aquelas que se destacam e nos fazem sorrir. Seja por penderem para o nosso lado, seja pela ironia da frase ("Ela é tão linda! Deve sair ao pai..."), seja por serem tão caricatas. Diria que é como o totoloto, não fosse a balança pesar mais para o lado do pai. Mas eu não me importo nada. Tanto que, como me asseguraram no outro dia, o olhar dela quando faz assim é tal e qual a mãe! Assim como a sobrancelha esquerda! Há lá maior motivo de orgulho?!

8 de fevereiro de 2011

A Bela Adormecida

Eu bem tentei. Tirei-a do ovo, despi-lhe o casaco, dei-lhe beijinhos, apertei-lhe os pés. Não era nada com ela. Às tantas, lá acordou e, depois de muito espreguiçar o sono, fez aquele biquinho de quem “está a aprender”, como diz a avó, ou de quem acabou de acordar e está a avaliar a situação, como digo eu. Eu, excitadíssima por ela ter finalmente acordado, segui os exercícios com diligência e pratiquei yoga com a minha bebé pela primeira vez. Ela, nos míseros cinco minutos em que se manteve acordada, colaborou e, atrevo-me a dizer, até gostou. Mas depois voltou a cair num sono profundo e assim ficou o resto da aula. Como uma Bela Adormecida a quem nem um Príncipe Encantado valeria. Só me restou esperar, desconsolada, que as outras mamãs terminassem a aula. A professora, uma querida, disse-me para voltar daí umas semanas e foi assim que fomos gentilmente escorraçadas da aula de Babyoga.
Chego a casa e oiço um fofinho “eu bem te disse que ela ainda era muito pequenina”. Mas às vezes é difícil distinguir as actividades que são para os bebés daquelas que são para as mães. E nesta altura do campeonato qualquer desculpa que me obrigue a sair de casa é uma excelente desculpa.
Pena a ventania.
Lembrem-me para não voltar a ter bebés no Inverno.

1 de fevereiro de 2011

Seis semanas

Agora as roupas vão deixando de lhe servir aos poucos. Hoje umas calças. Ontem foi uma camisola interior. Um body. O gorro que já não passa na cabeça. A minha menina está a crescer e o tempo a passar.
Cada vez me afasto mais do momento do parto, que tanto custou, mas que não quero esquecer. Dizem-me que, eventualmente, todas se esquecem dos momentos difíceis do parto. Mas não sei como é possível apagar da memória as 23 horas (de muito sofrimento) que precederam o momento em que a vi, com os olhinhos inchados e o nariz que logo me fez lembrar uma foto do pai que vira em algum álbum de infância. É o teu nariz. Com a mania que as pessoas têm de dizer que as nossas feições nunca são nossas, mas de outra pessoa qualquer.
Ela nasceu. Saudável, perfeitinha, bonitinha e, como se viria a comprovar mais tarde, calminha. Durante as aulas de ginástica pós-parto, quando a deixo com as amas que o centro disponibiliza para cuidarem dos rebentos, devo ser a única mãe que ainda nunca teve de interromper a aula para confortar o bebé chorão. Dá-me um certo orgulho e, confesso, alívio. Durante o primeiro mês foi difícil habituar-me à ideia de que agora já não sou só eu. Agora é ela. E depois eu. Isto se não vier outra coisa qualquer antes. Como a Família. Primeiro ela. Depois a família. Depois, então, eu. Admito que foram algumas as vezes em que me deixei vencer pela frustração. Mas à medida que ela cresce, que eu vou aprendendo os ritmos dela, que os vou acertando com os meus e fazendo uns ajustes, à medida que vou recebendo sorrisos marotos de quem só agora aprende a sorrir e lhe tento roubar mais alguns com piadolas sem jeito ditas com aquela voz que as pessoas fazem quando estão a falar com bebés, à medida que a roupa lhe vai deixando de servir e sinto que estou a criar um ser que vai aumentando de peso com o meu leite e que estou a conseguir fazer mais do que apenas ajudá-la a sobreviver, à medida que ela vai dormindo bem de noite e eu vou ganhando as batalhas do berço, à medida que tudo isto acontece, então todas as frustrações e inquietações se transformam nesta alegria inexplicável, nesta paz de espírito imensa de saber que a tenho junto a mim. E isto é tão bom.